domingo, 26 de setembro de 2010

Imagens.

Está no ar o álbum virtual com reportagens, folders e outras imagens referentes às Jornadas passadas.

http://www.flickr.com/photos/xiijornada/

Cultura com aspas – homenagem a Manuela Carneiro da Cunha

A homenagem a Manuela Carneiro da Cunha no âmbito da tradicional Jornada das Ciências Sociais da Unesp de Marília, responde a dois marcos: a volta da antropóloga ao Brasil depois de lecionar por 15 anos na Universidade de Chicago, e a publicação de um livro que recupera sua trajetória intelectual e cobre sua atuação até o presente. Entenda-se que esses marcos apontam mais para uma abertura para o futuro do que para um balanço do passado. Manuela volta ao Brasil com um importante projeto de pesquisa sobre os efeitos da proteção de direitos culturais e intelectuais de povos tradicionais e põe em funcionamento todo seu aparato teórico para alimentar um ardente debate contemporâneo a respeito dos conhecimentos tradicionais e os direitos intelectuais sobre eles.

Um sotaque português é suficiente para situar Manuela-brasileira onde ela se sente bem: na fronteira. Se analisados em conjunto, os textos que compõem sua trajetória dão uma dupla impressão. De um lado, uma vertigem pela diversidade de temas e perspectivas – ameríndios, negros, indigenistas, escravistas, a catequese, a legislação ao longo dos anos -; estilos de escrita – análise estrutural de mito, etnografia, historiografia, divulgação científica, crônica-; e intenções – teoria e política. De outro, o equilíbrio produzido por um fio condutor: a noção de “interface”. Esses assuntos e formatos tão diversos, que no entanto dialogam entre si, revelam-se todos problemas de fronteira. Seu campo de trabalho comporta assim um universo semântico expandido, orquestrando as vozes do missionário, do colonizador, do legislador, do indígena, do negro, dos cientistas e dos xamãs, num ambiente em que se negociam e manipulam símbolos e relações de poder.

Manuela participou ativamente tanto da vanguarda teórica do estruturalismo, como das iniciativas políticas para a reivindicação de direitos indígenas na Constituição de 88. Mais recentemente, dialoga com a antropologia de ponta, e simultaneamente embrenha-se em um dos debates mais prementes para os povos indígenas, acerca de seus conhecimentos tradicionais. A reflexão teórica informa tanto quanto possível a posição política de Manuela e faz dela figura paradigmática de uma intelectual que se faz no seio de uma disciplina acadêmica num país em que os sujeitos estudados são também, ao seu lado, atores políticos.


Sobre Manuela Carneiro da Cunha
Nascida em Cascais, Portugal, mudou-se com sua família para São Paulo aos onze anos. Formou-se em matemática pura na Faculté des Sciences, Paris, em 1967, e a seguir participou durante três anos dos seminários de Claude Lévi-Strauss. De volta ao Brasil em 1970, ingressou na pós-graduação em antropologia social da Unicamp, defendendo sua tese de doutorado “Os mortos e os outros – ritos funerários e a noção de pessoa entre os Krahô”, em 1975, publicada em 1978. Lecionou na Unicamp de 1972 a 1984. Em 1975, na Nigéria, iniciou uma pesquisa sobre os descendentes de escravos libertos que foram do Brasil para a África Ocidental. Desse estudo, ampliado em arquivos missionários na Itália e pesquisa bibliográfica sobre a condição dos libertos no Brasil realizada na Universidade de Cambridge, resultou Negros, estrangeiros, sua livre-docência no departamento de antropologia social da Universidade de São Paulo, publicada em 1985. O livro aborda o conceito de etnicidade, que estaria presente em toda a atividade política da autora.
A partir de 1978 engajou-se na defesa dos direitos dos índios no Brasil. Foi co-fundadora e primeira presidente da Comissão Pró-Índio de São Paulo, de 1979 a 1981. Como presidente da Associação Brasileira de Antropologia (aba) de 1986 a 1988, levou essa instituição a desempenhar um papel fundamental no desenho e na aprovação do capítulo sobre os direitos dos índios na Constituição de 1988. Docente do departamento de antropologia social da usp desde 1984, fundou em 1990 nessa universidade e com outros pesquisadores o Núcleo de História Indígena e do Indigenismo (nhii), responsável entre outras coisas, pela publicação de A história dos índios no Brasil, uma referência na área. A partir da década de 1990, dedicou-se aos conhecimentos e questões de direitos intelectuais de povos tradicionais. A Enciclopédia da Floresta (2002), organizada com Mauro Almeida, foi um dos resultados de extensa pesquisa que co-dirigiu sobre populações tradicionais e conservação ambiental no Alto Juruá. Atualmente realiza estudos sobre os mecanismos sociais responsáveis pela agrobiodiversidade no médio Rio Negro e dirige um projeto de pesquisa sobre os efeitos dos direitos intelectuais sobre as populações tradicionais e seus sistemas de conhecimentos.
Professora titular de antropologia da USP em 1992, dois anos depois, Manuela Carneiro da Cunha se tornou “full Professor” no departamento de antropologia da Universidade de Chicago, onde lecionou até 2009. Foi também, ao longo de sua vida acadêmica, professora visitante em várias universidades e fellow do Center for Advanced Studies in Behavioral Sciences. Em 2004, deu a conferência anual Marc Bloch, em Paris, que está na origem do seu panfleto “’Cultura’ e cultura”. Foi membro do Conselho Deliberativo do cnpq e membro do iag, o órgão independente de especialistas que monitorou o Programa de Florestas Tropicais financiado pelo PPG-7.  Recebeu, entre outros, o Prêmio Érico Vanucci Mendes em 1992, a Médaille de Vermeil, da Academia Francesa em 1993, a Ordem do Mérito Científico em 2002 e, em 2007, em conjunto com Mauro W. B. de Almeida, o Prêmio Chico Mendes do Acre. Desde 2002, é membro da Academia Brasileira de Ciências.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

A Jornada..

A jornada das Ciências Sociais é um dos eventos mais tradicionais realizados na Unesp, campus de Marília, e contou ao longo de 24 anos com a presença de importantes intelectuais que deram significativa contribuição para o desenvolvimento das Ciências Sociais no Brasil. Os pensadores homenageados na Jornada de Ciências Socais foram Florestan Fernandes (1986), Caio Prado Júnior (1988), Antônio Cândido (1990), Octávio Ianni (1992), Maria Isaura Pereira de Queiroz (1994), Leandro Konder (1998), Gilberto Freyre (2000), Nelson Werneck Sodré (2002), Roberto Cardoso de Oliveira (2004), Celso Furtado (2006) e Juarez Brandão Lopes (2008).

As Jornadas estruturam-se em uma conferência inaugural, proferida pelo homenageado, mesas-redondas, sessões de comunicações científicas e sessões de vídeos. Além dos debates e das discussões, as contribuições da Jornada foram materializadas em coletâneas, que se tornaram referência para a consulta sobre a história do pensamento social no país. Neste aspecto, a reflexão das jornadas procurou fazer uma revisão crítica das teorias, das pesquisas e do impacto que as obras destes autores tiveram tanto na academia quanto na definição de políticas públicas, bem como em outras esferas da vida social.

A XII jornada insere-se no esforço da Unesp, campus de Marília, de fortalecimento do campo da Antropologia. A idéia é demonstrar o evidente: o pensamento antropológico tem expressivo papel na fundamentação do campo das Ciências Sociais. Mais particularmente, a Antropologia no Brasil contribuiu significativamente na construção e formulação do campo cultural, no aprofundamento da discussão sobre cultura, políticas culturais pluralísticas, preservação do patrimônio cultural, relações inter-étnicas e documentação da própria prática do antropólogo. Enfim, é preciso ressaltar a importância da consolidação da Antropologia no ensino de graduação e de pós-graduação. O campo da Antropologia contribuiu também para a consciência da importância da diversidade como patrimônio do país.
O evento, portanto, gira em torno de um debate crítico com Manuela Carneiro da Cunha e com sua produção acadêmica, institucional e política. Para tanto, foram convidados professores, pesquisadores e profissionais que tiveram oportunidade, em momentos distintos, de entrar em contato com a homenageada e sua obra. Trata-se, portanto, de um espaço acadêmico de balanço da obra e de reconhecimento crítico das suas contribuições